quinta-feira, 26 de abril de 2012

Falsos Profetas (parte 1)



Por Edson Moura 

Não sei se por falta de tempo ou por pura e simples falta de interesse, mas deixei que a poeira baixasse para falar, somente agora, de um assunto que gerou polêmica na mídia, e um alvoroço no meio evangélico. Por um tempo este tipo de incidente não me incomodou, uma vez que sou ateu, e sendo ateu, pouco deveria me importar com escândalos em igrejas evangélicas, católicas ou qualquer outro tipo de religião, crença e afins. Mas o problema é que, antes de ser ateu, sou pai, filho, e cidadão da Terra, e é triste ver às vezes como alguns amigos, familiares e até mesmo estranhos são literalmente enganados, engodados, fisgados e depois descartados por algumas igrejas e crenças.

De quem vou falar agora? Já falei uma vez do “Apóstolo Agenor Duque”, meu amigo e coautor neste blog, Marcio Alves já escreveu sobre “Bispo Edir Macedo”. Também já escrevi duras críticas à “Apóstolo Sérgio Lopes, Silas Malafaia, Valnice Milhomens, Bispa Sônia e Apóstolo Estevan Hernandes, Marco Feliciano, Reverendo João Batista e R.R. Soares, enfim, já disse e repito que para mim não passam de charlatães, picaretas, ladrões covardes, ou como se diz no meio evangélico: “Lobos em pele de cordeiro”. Poupei somente um, e esse um agora será alvo de minhas críticas também.

Não quero atacá-lo como pessoa, e sim como “líder”. Isso mesmo, em dos maiores líderes religiosos do Brasil. “Dono” de uma igreja que vem crescendo exponencialmente às custas da ingenuidade de seus fiéis, que são manipulados a tal ponto, que torna-se praticamente impossível convencê-los de que os documentos comprovando a roubalheira são verdadeiros. Pois é, (este é um de seus muitos chavões), “O King Kong” (Edir Macedo) é mico perto de Valdemiro Santiago. Ele mesmo! Valdemiro Santiago tem convencido milhões de pessoas a esvaziarem seus bolsos em troca de um milagre, de uma cura milagrosa, de um emprego em tempos de crise, de um precatório que não sai, e tantos outros desejos de seus fiéis. Meu povo sofre por que lhe falta conhecimento.

O Povo é burro! Não há mais como negar. Sofre por que quer! Parece que gosta! Bando de inúteis! Merecem mesmo que um malandro tire até seus últimos centavos! Era isso que eu dizia em alguns momentos de ira. Mas no fundo não peno assim. Quero que o povo se liberte. Quero que meu povo seja autossuficiente. Quero que meus concidadãos abram os olhos, arregacem as mangas, que trabalhem com a força de seus braços e de suas mentes para conseguir seus bens pessoais, e não que fiquem implorando a um Deus que nem sequer existe, que lhes dê proteção, prosperidade e vida. Então, só para encerrar este parágrafo e entrar realmente no texto, gostaria de salientar, e se possível gritar, que: Não se enganem mais meu povo! Valdemiro Santiago é um ladrão! Assim como todos os outros que citei acima.

Bom, feito o desabafo, quero agora trazer à você, crente ou não, ateu ou não, cético ou não, um pequeno estudo, com exemplos e tudo mais, de como escapar das garras da mentira. Inspirado por Carl Sagan, gostaria que você que chegou até aqui, e que possivelmente já está me odiando, ou amando, quem sabe, não pare a leitura. Vá até o final. Quem sabe poderá aprender algo. Quem sabe, a partir deste texto, seu senso crítico e melhor, autocrítico, aflore. E toda vez que tentarem enganar você, algumas nuances o farão questionar, o farão refletir se é possível, se existe outra hipótese, mas sempre partindo do principio lógico de que: “A ausência de evidências não é a evidência da ausência”.

Benjamim Franklin, em 1784 escreveu: “Havendo tantos transtornos que se curam sozinhos e tanta disposição na humanidade a enganar-se a gente mesmo e a outros, e como meu comprido tempo de vida me deu frequentes oportunidades de ver elogiados alguns remédios como se curassem tudo para ser deixados a seguir totalmente de lado como inúteis, não posso a não ser temer que a expectativa de grande benefício do novo método para tratar enfermidades resultará uma ilusão. Entretanto, em alguns casos esta ilusão pode ser de utilidade enquanto dure”. Mas, “cada época tem sua loucura particular”.

Diferentemente de Benjamim Franklin, a maioria dos cientistas consideram que não é sua tarefa revelar os enganos pseudocientíficos, muito menos a autossugestão sustentada apaixonadamente. Além disso, tampouco tendem a ser muito bons nisso. Os cientistas estão acostumados a lutar com a natureza que, embora possivelmente ofereça seus segredos com relutância, luta de maneira justa. Frequentemente não estão preparados para esses pastores sem escrúpulos (e pastores sem escrúpulos é redundância, eu sei) que não obedecem a uma norma de conduta. Na minha opinião, os pastores estão no negócio do engano. Praticam uma das muitas ocupações (como a atuação teatral, a publicidade, a religião burocrática e a política) em que o que um observador ingênuo poderia interpretar como mentira é aceito socialmente como se fora em serviço para o bem maior. Muitos pastores dizem que não enganam e sugerem que seus poderes lhes são dados por Deus. Alguns usam seus conhecimentos para pôr em evidencia aos enganadores que há entre seus colegas de ramo. Um ladrão se dispõe a caçar a outro ladrão.

Poucos reagem a este desafio com tanta energia como Marcio e eu, que somos considerados “decepcionados com Deus”. A sobrevivência até nossos dias do misticismo dos tempos de Noé e a superstição não me irritam tanto quanto a aceitação acrítica das obras de misticismo e superstição, religiosas ou não, que podem defraudar, humilhar e às vezes inclusive matar. Como todos os seres humanos, também sou imperfeito. Às vezes sou intolerante e condescendente e não sinto nenhuma simpatia pelas fragilidades humanas que fundamentam a credulidade. 

Pretendo trabalhar muito ainda para desmascarar alguns feiticeiros, videntes remotos, “telepatas”, pastores cheios da unção e curandeiros que extorquem seu público. Não estou preocupado se mais cedo ou mais tarde venham me chamar de “obcecado pela realidade”. Quem dera pudesse um dia dizer o mesmo de nossa nação e nossa espécie. Qualquer um há de convir comigo que as coisas andam muito bem no falso, mas, lucrativo negócio da cura mediante a fé. Quero ainda poder mostrar que os que se levantam das cadeiras de rodas e, conforme se afirma, foram curados pelo pastor, ou como dizem, Jesus, nunca tinham estado confinados a cadeiras de rodas, são contratados pelos bandidos do púlpito para florearem o “show da fé” que estão apresentando. 

Desafio qualquer pastor safado a proporcionar provas médicas sérias para dar validade a suas operações miraculosas. Convido às agências locais e federais do governo a aplicar a lei contra a fraude e a má prática médica, pois é isso que estão fazendo muitas vezes, impedindo por meio da sugestão, que o doente procure um médico de verdade. Critico aos meios de comunicação por seu proposital afastamento do tema. Desejo trazer à tona o desprezo profundo desses pastores, para com seus “pacientes fiéis” e paroquianos. Muitos são enganadores intencionais que usam a linguagem e os símbolos evangélicos cristãos ou da Nova Era para aproveitar-se da fragilidade humana. Possivelmente alguns deles tenham motivos não venais. Possivelmente... possivelmente.

Ou será que estou sendo muito radical e severo? No que se diferencia o enganador ocasional na igreja, da fraude ocasional na ciência? É razoável suspeitar de toda uma profissão porque há algumas maçãs podres? Parece-me que, como mínimo, há duas diferenças importantes. Primeiramente, ninguém duvida de que a ciência funcione de verdade, embora de vez em quando possa oferecer uma afirmação equivocada ou fraudulenta. Mas, que aconteça cura “milagrosa” graças à fé, independentemente da capacidade de o corpo curar-se naturalmente, é francamente duvidoso. Em segundo lugar, e muito importante, a ciência expõe, quando descoberta uma fraude e engano quase exclusivamente por si mesma, não espera que outras entidades o façam. É uma disciplina que se vigia a si mesmo, o que significa que os cientistas são conscientes do potencial de mentira e engano que existe. Mas quase nunca são os pastores quem revelam a fraude e engano na cura pela fé. Certamente, é surpreendente a resistência das Igrejas, sinagogas e centros de umbanda em condenar o engano demonstrável entre suas instituições.

Quando fracassa a medicina convencional, quando temos que nos enfrentar à dor e a morte, certamente estamos abertos a outras perspectivas de esperança. E, ao fim e ao cabo, há algumas enfermidades psicogênicas. Muitas podem ser quando menos mitigadas com uma mentalidade positiva. Os placebos são medicamentos fictícios, frequentemente pílulas de açúcar. As companhias de medicamentos comparam rotineiramente a eficácia de seus medicamentos com os placebos administrados a pacientes com a mesma enfermidade sem possibilidade de reconhecer a diferença entre o fármaco e o placebo. Os placebos podem ser assombrosamente efetivos, especialmente para resfriados, ansiedade, depressão, dor e sintomas que é verossímil que estejam sendo gerados pela mente. É do conhecimento de muitos que o fato de acreditar possa produzir endorfinas (pequenas proteínas do cérebro com efeitos como a morfina). Um placebo só funciona se o paciente acredita que é uma medicina efetiva. Dentro de limites estritos, parece que a esperança pode transformar-se em bioquímica.

Grandes quantidades de pessoas acreditam na existência o que se chama cura psíquica ou espiritual. Ao longo da história humana se associaram à padres, freiras e a uma ampla variedade de curandeiros, reais ou imaginários. A “escrófula”, uma espécie de tuberculose, chamava-se na Inglaterra o “mal do rei” e se supunha que só podia ser curada mediante a mão do rei. As vítimas esperavam pacientemente para que o rei as tocasse; o monarca se submetia brevemente a outra pesada obrigação de seu alto cargo e, embora não parecesse que se curasse ninguém, a prática continuou durante séculos.

Um famoso milagreiro do século XVII foi Valentino Greatracks. Descobriu, com certa surpresa, que tinha poder para curar enfermidades, incluindo resfriados, úlceras, e epilepsia. A demanda de seus serviços aumentou de tal modo que não tinha tempo para nada mais. Afirmava que todas as enfermidades eram causadas por espíritos maus, a muitos dos quais reconhecia e chamava por seu nome. 

Tão grande era a confiança nele, que o cego acreditava ver a luz que não via, o surdo imaginava que ouvia, o coxo que andava bem e o paralítico que tinha recuperado o uso de suas extremidades. A ideia de saúde fazia que o doente esquecesse por um tempo seus males, e a imaginação, dava uma falsa visão a uma classe, pelo desejo de ver, assim como acontecia um falso milagre pelo forte desejo de ser curado do doente.

Há inumeráveis casos na literatura mundial de exploração e antropologia não só de doentes curados pela fé no milagreiro, mas também de gente que se consome e morre pela maldição de um bruxo.

Em 1858 se informou de uma aparição da Virgem Maria em Lourdes, França. A  “mãe de Deus” confirmou o dogma de sua concepção imaculada que tinha sido proclamado pelo papa Pio XI só quatro anos antes. Algo assim como cem milhões de pessoas foram até Lourdes com a esperança de curar-se, muitas delas com enfermidades que a medicina da época não podia vencer. A Igreja católica romana rechaçou a autenticidade de grande quantidade das curas chamadas milagrosas. Só aceitou sessenta e cinco milagres em quase um século e meio (de tumores, tuberculose, cegueira, bronquite, paralisia e outras enfermidades, mas não, por exemplo, a regeneração de uma extremidade ou uma coluna vertebral partida). 

Das sessenta e cinco curas, a proporção é de  dez mulheres por cada homem. As possibilidades de uma cura milagrosa em Lourdes, portanto, são de uma entre um milhão. Há tantas possibilidades aproximadas de curar-se depois de uma visita a Lourdes como de ganhar na mega-sena, ou de morrer em acidente de avião... inclusive indo até Lourdes.

A taxa de remissão espontânea de todos os cânceres, agrupados, estima-se entre um para cada dez mil e um para cada cem mil. Se só cinco por cento dos que vão a Lourdes fossem ali para tratar de um câncer, deveria haver entre cinquenta e quinhentas curas “milagrosas” só de câncer. Como só três das sessenta e cinco curas testemunhadas são de câncer, a taxa de remissão espontânea em Lourdes parece ser inferior à que existiria se as vítimas ficassem em casa. Certamente, se você for um entre os sessenta e cinco curados, será muito difícil lhe convencer de que sua viagem a Lourdes não foi a causa da remissão da enfermidade. Algo similar parece, e deve acontecer nas igrejas evangélicas, centros de umbanda e afins .

No próximo texto, que não demorará muito, darei continuidade ao tema e algumas maneiras de escapar dos enganadores. Sugerirei algumas perguntas que devemos fazer e "nos fazer", toda vez que nos apresentarem uma falácia religiosa de cura por fé.

Continua...     Falsos Profetas (parte 2)                         


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